Isto significa que, a partir de agora, esse tema passa a fazer parte de uma lista de assuntos que devem ser incorporados às propostas pedagógicas de estados e municípios, a exemplo do que ocorrerá com Educação das relações étnico-raciais e ensino de história e cultura afro-brasileira, Educação ambiental e Educação para o trânsito, entre outros.
Embora considere a Educação financeira um tema interdisciplinar, apenas a Base de Matemática o incorpora explicitamente. Ele aparece sugerido como “contexto” para o desenvolvimento do conteúdo em quatro habilidades (uma no 5º, uma no 6º, uma no 7º e uma no 9º ano), todas ligadas a conteúdos típicos da matemática financeira, como porcentagem e cálculo de juros.
Há, porém, uma distinção entre Matemática financeira e Educação financeira. Enquanto a primeira é uma área que aplica conhecimentos matemáticos à análise de questões ligadas a dinheiro, a segunda está ligada à formação de comportamentos do indivíduo em relação às finanças. “A contribuição mais importante da Educação financeira é ajudar o aluno, desde cedo, a desenvolver a capacidade de planejar sua vida, sua família, e tomar boas decisões financeiras”, explica Cláudia Forte, superintendente AEF Brasil, entidade ligada à Federação Brasileira de Bancos (Febraban) que produz materiais e realiza projetos em escolas públicas do país.
Só em Matemática?
“É importante ficar claro que Educação financeira não é exclusividade da disciplina e é algo diferente de Matemática financeira”, explica Ruy Cesar Pietropaolo, um dos dos autores da BNCC desde a primeira versão.
O texto introdutório da Base de Matemática chega a sugerir um trabalho conjunto com a disciplina de História, “visando ao estudo do dinheiro e sua função na sociedade, da relação entre dinheiro e tempo, dos impostos em sociedades diversas, do consumo em diferentes momentos históricos, incluindo estratégias atuais de marketing”. A Base de História, porém, não faz menção direta ao termo.
Apesar disso, Ronaldo Vieira da Silva, Chefe-Adjunto do Departamento de Educação Financeira do Banco Central do Brasil (DEPEF), que contribuiu com a discussão do documento, afirma que “a nova BNCC trata da Educação financeira e do consumo em quatro das cinco áreas do conhecimento que a constituem, nas disciplinas de Língua Portuguesa, Arte, Língua Inglesa, Matemática,Geografia e História”.
Ele explica que o tema está contemplado de diversas maneiras. “No caso do ensino da Língua Portuguesa, uma das habilidades incluídas prevê que os estudantes aprendam a ‘ler e compreender, com autonomia, boletos, faturas e carnês’. Já em Ciências Naturais, a Base destaca habilidades relacionadas ao cálculo do consumo de energia elétrica de eletrodomésticos e a avaliação do impacto do uso no orçamento mensal da família”, exemplifica. Segundo Ronaldo, “essas habilidades têm o potencial de impactar positivamente no cotidiano da vida financeira do cidadão.”
Antiga demanda
Não é de hoje que governos, educadores e entidades discutem a inserção da Educação financeira nas escolas. O Brasil já tem, desde 2010, a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), que prevê a realização de uma série de ações nesse âmbito, tanto nas instituições escolares quanto na sociedade em geral. O decreto também instituiu o Comitê Nacional de Educação Financeira (CONEF), dentro do Ministério da Fazenda, que conta com membros do Ministério da Educação (MEC), do Banco Central e de outros órgãos do governo e da sociedade civil.
Durante o processo de construção da BNCC, essas instituições trabalharam para que o tema fosse inserido no texto final. “O Banco Central participou de audiências públicas realizadas em 2017, defendendo a importância dele na formação dos alunos”, afirma Ronaldo. “Procuramos ouvir a todos, das universidades aos diversos conselhos, e contemplar as demandas dentro do possível”, lembra Ruy.
Os especialistas ouvidos por Nova Escola consideram que a presença da Educação financeira na BNCC representa um avanço. “Somos de uma geração em que os nossos pais tinham vergonha de dizer que não tinham dinheiro e viam como único caminho se endividar. Por isso é tão importante aprender a lidar com o dinheiro. Isso faz parte da formação cidadã”, opina Cláudia.
Fonte: Nova Escola