Entre os estudantes do ensino superior,
38% não dominam habilidades básicas de leitura e escrita, segundo o
Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), divulgado pelo Instituto
Paulo Montenegro (IPM) e pela ONG Ação Educativa. O indicador reflete o
expressivo crescimento de universidades de baixa qualidade.
Criado em 2001, o Inaf é realizado por
meio de entrevista e teste cognitivo aplicado em uma amostra nacional de
2 mil pessoas entre 15 e 64 anos. Elas respondem a 38 perguntas
relacionadas ao cotidiano, como, por exemplo, sobre o itinerário de um
ônibus ou o cálculo do desconto de um produto.
O indicador classifica os avaliados em
quatro níveis diferentes de alfabetização: plena, básica, rudimentar e
analfabetismo (mais informações nesta pág.). Aqueles que não atingem o
nível pleno são considerados analfabetos funcionais, ou seja, são
capazes de ler e escrever, mas não conseguem interpretar e associar
informações.
Segundo a diretora executiva do IPM, Ana
Lúcia Lima, os dados da pesquisa reforçam a necessidade de
investimentos na qualidade do ensino, pois o aumento da escolarização
não foi suficiente para assegurar aos alunos o domínio de habilidades
básicas de leitura e escrita.
"A primeira preocupação foi com a
quantidade, com a inclusão de mais alunos nas escolas", diz Ana Lúcia.
"Porém, o relatório mostra que já passou da hora de se investir em
qualidade."
Segundo dados do IBGE e da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), cerca de 30 milhões de
estudantes ingressaram nos ensinos médio e superior entre 2000 e 2009.
Para a diretora do IPM, o aumento foi bom, pois possibilitou a difusão
da educação em vários estratos da sociedade. No entanto, a qualidade do
ensino caiu por conta do crescimento acelerado.
"Algumas universidades só pegam a nata e
as outras se adaptaram ao público menos qualificado por uma questão de
sobrevivência", comenta. "Se houvesse demanda por conteúdos mais
sofisticados, elas se adaptariam da mesma forma."
Para a coordenadora-geral da Ação
Educativa, Vera Masagão, o indicativo reflete a "popularização" do
ensino superior sem qualidade. "No mundo ideal, qualquer pessoa com uma
boa 8.ª série deveria ser capaz de ler e entender um texto ou fazer
problemas com porcentagem, mas no Brasil ainda estamos longe disso."
Segundo Vera, o número de analfabetos só
vai diminuir quando houver programas que estimulem a educação como
trampolim para uma maior geração de renda e crescimento profissional.
"Existem muitos empregos em que o adulto passa a maior parte da vida sem
ler nem escrever, e isso prejudica a procura pela alfabetização",
afirma.
Jovens e adultos. Entre as pessoas de 50
a 64 anos, o índice de analfabetismo funcional é ainda maior, atingindo
52%. De acordo com o cientista social Bruno Santa Clara Novelli,
consultor da organização Alfabetização Solidária (AlfaSol), isso ocorre
porque, quando essas pessoas estavam em idade escolar, a oferta de
ensino era ainda menor.
"Essa faixa etária não esteve na escola
e, depois, a oportunidade e o estímulo para voltar e completar
escolaridade não ocorreram na amplitude necessária", diz o especialista.
Ele observa que a solução para esse
grupo, que seria a Educação de Jovens e Adultos (EJA), ainda tem uma
oferta baixa no País. Ele cita que, levando em conta os 60 milhões de
brasileiros que deixaram de completar o ensino fundamental de acordo com
dados do Censo 2010, a oferta de vagas em EJA não chega a 5% da
necessidade nacional.
"A EJA tem papel fundamental. É uma
modalidade de ensino que precisa ser garantida na medida em que os
indicadores revelam essa necessidade", diz Novelli. Ele destaca que o
investimento deve ser não só na ampliação das vagas, mas no estímulo
para que esse público volte a estudar. Segundo ele, atualmente só as
pessoas "que querem muito e têm muita força de vontade" acabam
retornando para a escola.
Ele cita como conquista da EJA nos
últimos dez anos o fato de ela ter passado a ser reconhecida e
financiada pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica
(Fundeb). "Considerar que a EJA está contemplada no fundo que compõe o
orçamento para a educação é uma grande conquista."
Fonte: Msn Brasil